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Resenha do Livro “O Panteísmo de Alan Watts” de David K. Clark

Tempo de leitura: 43 min

Escrito por Davi Klein
em setembro 30, 2024

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No livro “The pantheism of Alan Watts” de David K. Clark, o autor escreve sobre a cosmovisão panteísta do filosofo/professor espiritual Alan Watts, que em sua vida decidiu abandonar sua fé no Cristianismo e na capacidade da razão humana de conhecer a realidade e se voltou a religião oriental (principalmente o zen budismo), enfatizando a supremacia desta em relação a anterior. Watts era a favor de uma abordagem mais intuitiva, mística e experimental para compreendermos a natureza da realidade e a necessidade de nos libertarmos do pensamento conceitual (muito enfatizado nas tradições da filosofia grega e do cristianismo).

A história de Allan Watts

Nascido e educado na inglaterra, Watts veio aos EUA aos 23 anos de idade. Quando jovem já lia livros sobre a filosofia chinesa e aos 21 anos de idade escreverá seu primeiro livro – o espírito do Zen. Watts também foi afetado pelo Cristianismo. Em 1944 ele foi ordenado como padre anglicano e serviu como conselheiro espiritual na Northwesterm University até 1950.

Como um padre jovem, Watts buscou conciliar o Cristianismo e o Budismo, numa tentativa de unificá-los em um único sistema. Em 1964, ele chegou a conclusão de que tal sintese era impossivel. Ele dizia que no Cristianismo existia algo de “intransigente, teimoso, militante, rigoroso, imperioso e invencivelmente hipócrita”. Então, Allan Watts virou suas costas para o Cristianismo e desenvolveu sua linha de pensamento totalmente focada na perspectiva oriental.

O Cristianismo requer um comprometimento total com Jesus como a encarnação única de Deus. O fato de o Cristianismo dizer ser a verdade absoluta sobre como as coisas são não pode ser negado. Watts percebeu que uma escolha deve ser feita entre o Cristianismo e os insights da filosofia oriental.

Vamos entender melhor sobre essas diferenças nesse post:

A invasão do oriente no ocidente

A invasão do oriente ao ocidente está em proporsões elevadas – uma dessas causas é por conta do vazio e da superficialidade do estilo de vida materialista ocidental. O materialismo nos ensina que seremos felizes com as posses materiais. É um estilo de vida em que temos muito para viver bem, mas não temos algo maior pelo que viver.

Se quisermos entender qual é esse tipo de pensamento oriental, basta olharmos para o pensamento do filosofo Alan Watts, pois ele representa muito bem o tipo de pensamento oriental que invadiu o ocidente.

Desse vazio existencial, muitas pessoas se desviaram do materialismo para a extremidade oposta – o panteismo. O panteismo sugere que não alcançamos a felicidade por meio de nossas posses e sim por meio do desapego de nossas paixões.

O racionalismo, a confiança exagerada no intelecto humano, levou a descobertas muito importantes para a humanidade. A ciência certamente melhorou a qualidade física de nossas vidas – o mundo certamente está um lugar melhor para se morar e um dos grandes responsáveis por esses avanços foram o uso da razão e das ciências.

Muitos, porém, não consideram que a ciência seja elevada ao status de divindade ao ponto de conseguir explicar toda a realidade (autoridade suprema).

Da mesma forma, o naturalismo, a visão de mundo que diz que o universo é o resultado de forças naturais e autoexplicativas, está caindo em descrédito. O próprio Allan Watts diz que os naturalistas: “falham em reconhecer que suas crenças sobre o universo também aplicam a si mesmos e as suas declarações. Se o universo não tem significado, então essa próprio declaração também não possui nenhum significado”.

Sartre e Camus criaram um significado transcendente ao afirmarem que a falta de significação da existência (que é a base de suas filosofias) é a base da existência.

Nas palavras de Paul Tillich, todos nós temos uma preocupação fundamental – a necessidade de um significado nesse mundo secular (é uma reação existencial de vivermos em um mundo sem estruturas de significado).

O declinio na confiança da ciência e do naturalismo, assim como a tendência humana da busca por significado foi o ambiente propício para a crescente procura de cultos panteístas em nossa cultura.

A popularidade de tais religiões se deu por algumas razões:

  • A primeira delas é que a visão do mundo explicada pelo panteísmo é muito simples. Ela faz do elemento da unidade o conceito básico de sua visão de mundo. O panteismo também exclui a necessidade de responder a questão díficil que é colocada ao teismo do por que existe mal no mundo em um mundo criado por um Deus que é bom?
  • O segundo lugar é que o panteísmo assegura ao panteísta que ele é relacionado a realidade última. O ensinamento panteísta sobre a união com Deus garante que nossa esperança por significado auto-transcendente irá ser atingido.
  • Em terceiro lugar, o panteísmo garante que a realidade em que eles estão em contato é a absoluta. Ou seja, se Deus criou tudo o que existe, é óbvio que não pode existir nada exterior/além de Deus. O Panteismo tem sua natureza tudo inclusiva, que tudo absorve.
  • Em quarto lugar, o panteismo parece ser a conclusão comum dos místicos de todas as épocas e culturas que encontraram união com Deus em suas experiências de êxtase. Esses mestres esotéricos parecem possuir um “avanço”, uma vantagem de conhecimento intuitivo da natureza da realidade.
  • Em quinto lugar, as religiões que possuem uma visão de mundo panteísta comumente minimizam a importância da razão, da lógica e do intelecto – essa visão de mundo serve para restaurar nossas capacidades emocionais, sensitivas, intuição e espiritualidade que se perderam na era do racionalismo (essa é uma época superintelectualizada, a visão panteista nos dá uma nova alternativa).

CS Lewis diz: “O Panteísmo certamente é agradável a mente moderna, o panteismo é agradável a nossas mentes não porque é o estagio final em um processo longo de iluminação, mas porque é quase tão antigo quanto nós somos, longe de ser refinamento religioso último, o panteísmo é a tendência natural da mente humana.”

A orientação religiosa dos gregos antigos, muitas das vezes, era panteista. Na escola platonica que culminou em Plotinus, o “Um” panteísta que se encontra por trás do conhecimento se tornou a realidade suprema do universo. A visão dominante da Índia é uma visão panteista. O sistema metafísico que cresceu na índia se tornou a base metafísica de muitas religiões do oriente, como o Hinduísmo, o Budismo.

Alan Watts – Panteísmo e Cristianismo

A visão de Allan Watts, apesar de representar apenas um dos diferentes tipos de panteísmo, é útil para entendermos sobre as implicações dessa visão de mundo.

Watts acreditava que a Igreja Cristã era muito dogmática. Ele tentou realizar sinteses entre o Cristianismo e o Panteísmo quando escreveu seu livro: “Mito e ritual no Cristianismo” e seu livro “Behold the spirit” , dizendo que o Panteismo e o Cristianismo eram compatíveis.

Devido a atitude de separação e precisão lógica e teológica do Cristianismo, Alan Watts começou a se desinteressar por tal cosmovisão. – Embasou sua visão panteista em trechos de Bíblia como “Eu e o pai somos um”.

Ele acreditava que a alegação da igreja de ser o melhor de todos os caminhos para Deus era uma engano e um sintoma de ansiedade.

Ele dizia que o verdadeiro cristianismo era encontrado nas escritas dos grandes místicos cristãos que experienciaram união com Deus.

Watts foi influenciado por Aldoux Huxley que sustentava a ideia de que todas as culturas de todos os tempos continham individuos que mantinham uma visão panteista de mundo. O verdadeiro cristianismo para Huxley era o de Mestre Eckhart e o de São João da Cruz.

Huxley argumentava que não fazia diferença se uma pessoa fosse Budista, Hinduístas ou Cristã, pois para ele todos as religiões levariam (se entendidas corretamente) a Deus. Huxley popularizou a Filosofia Perene, uma combinação da metafísica que encontra uma realidade divina no cerne desse mundo (incluindo em objetos e pessoas); a psicologia que reconhece na psicologia humana algo similar e idêntico a essa realidade divina e a ética que diz que o objetivo final do homem é o conhecimento dessa realidade divina subjacente.

Uma famosa parábola oriental ilustra a filosofia perene muito bem. Quatro homens decidiram subir uma montanha, porém eles a aproximam por quatro diferentes direções. Isso no entanto não faz diferença, pois todos os caminhos dão no topo da montanha. Essa é a mesma coisa com as religiões: os caminhos são muitos, mas o final é o mesmo.

Watts afirmou muito a filosofia perene, que encontrava autoridade na vida de muitos místicos de diferentes culturas. Depois ele entendeu que o Cristianismo tradicional não possui relações com o Panteismo. Quando ele escreveu “Beyond Theology” ele diz que sua tentativa de atingir uma síntese entre o Panteismo e o Cristianismo não tinha evidências – isso porque os Cristãos não consideram sua fé como sendo uma entre os muitos caminhos possíveis a Deus, o Cristianismo nunca perdeu o seu elemento de “Tudo ou Nada” – ou você está com Cristo ou não está.

Alan Watts renuncia sua carreira de pastor anglicano e admite sua posição como Panteísta –“Qualquer sugestão de que exista algum nível interior na qual o homem e Deus são idênticos é chamado de Panteísmo”.

A versão de Watts do panteísmo não é aquela do MONISMO absoluto encontrada no filosofo hindu do século oitavo chamado SHANKARA. A uniformidade Simples é uma visão na qual tudo o que existe faz parte de um todo-não diferenciado. Existem versões do panteismo, como as de Watts, que aceitam a existência de polos opostos (como bem x mal, corpo x alma), mas que apesar de serem opostos são relacionados e fazem parte do mesmo campo único.

Definir o termo panteísmo pode ser difícil. Alguns dizem que palavras como monismo e panteismo são rótulos criados pelos ocidentais, conceitos que são inexistentes no oriente.

O termo panteísmo é utilizado para se referir ao conjunto de religiões e teorias metafísicas que diz que toda a realidade é UMA.

O panteísmo então é a visão de mundo que diz que o individuo humano não é, em última análise, real (como existência separada) – o que existe na verdade é uma realidade unificada.

Um estudo de Alan Watss é util pois, por ser um eclético, ele reuniu os elementos em comum de muitas tradições orientais. Sendo um ocidental, ele tornou o pensamento das tradições orientais acessíveis ao ocidente. A própria jornada espiritual é útil de entender, pois representa a jornada de muitos nós – o desencanto pela razão e a esperança em abordagens mais intuitivas da realidade. Watts abandonou o Cristianismo racionalista em favor de um visão de mundo em que eliminava totalmente o pensamento conceitual.

O sistema panteísta de Allan Watts

A visão de mundo de Allan Watts sugere que a realidade última não pode ser conhecida por conceitos e pelo uso da razão que é caracterizada pela filosofia ocidental. Muitos ocidentais acreditam que as regras lógicas do pensamento (como o principio de que uma afirmação e seu oposto lógico não podem ser igualmente verdadeira no mesmo sentido e ao mesmo tempo) se aplicam a realidade.

Mas alguns ocidentais, como Plotinus, acreditam que o que é real não se conforma ou não é limitado por tais regras do pensamento, que a Realidade está além do reino governado pelas regras de pensamento baseada em conceitos opostos como cima/baixo, bom/mau, sagrado/secular, transcendente/imanente, etc. Watss concorda com Plotinus nesse ponto. Estar além da dualidade é a premissa básica da visão de vida de Watts.

Estar além da dualidade

Watts reconhece que a realidade que percebemos não parece ser unificada no um-todo-ontológico. O conhecimento que vem dos sentidos envolve um relacionamento entre o conhecedor e o conhecido, o que iria contradizer o monismo absoluto. A descrição fatual (incluindo a ciência) depende de um observador independente e desapegado. Porém, de acordo com Watts, o sentimento de contraste entre sujeito e objeto é somente convencional, que até serve de um propósito útil.

Para Watts, o problema é que os ocidentes ignoraram o fato de que nenhum observador independente realmente existe como individuo. O fato de percebermos opostos pelos sentidos não desconta o fato de que, para Watts, toda a dualidade pressupõe uma unidade. Nessa visão, inferno implica o céu e satanás implica Deus – de que aspectos contrastantes da realidade são ligados em uma unificação superior.

  • A natureza polar da realidade – Watts descreve o universo como uma entidade polar – nessa visão a polaridade significa algo a mais do que oposição e dualidade. Significa vermos que por detrás da aparente polaridade, existe uma unidade subjacente, estão em um relacionamento entre si – como as duas faces de uma moeda ou os dois polos do globo – são opostos inseparáveis – tais polos opostos seriam abstrações criadas pelo processo de conceptualização da mente e, por conta disso, tais extremidades conceituais não possuem tanta substância existencial do que a unidade não dividida (única, singular) que se encontra entre os polos.

A visão polar da realidade é refletida no conceito oriental de Yin Yang, que demonstra que todo o aspecto da realidade depende do outro aspecto da realidade para que possa existir.

  • O campo por trás da dualidade – a convenção faz o universo parecer ser bifurcado. Porém, pelo fato das dualidades que abrangem a realidade são correlatas e interativas, esse universo não pode ser totalmente compreendido por um conhecimento do tipo sujeito-objeto. Em vez disso, ambos os aspectos da dualidade devem ser levados em consideração pois a verdade última transcende toda a conceitualização. A percepção de um campo além das dicotomias de aprendizado convencional é necessária para a mente ser livre da ficção de um observador independente. Os aspectos do universo não existem em si mesmos, não possuem existencias separadas, fazem parte de um processo maior. O processo de unificar componente simples e aparentemente opostos em unidades maiores pode se desdobrar até que toda a realidade se torne um todo unificado. Na análise de Watts, Deus é o Ser que se encontra por trás de toda dualidade. Deus está absolutamente em si mesmo, além de toda a dualidade. Tal visão parece apontar para um estado de consciência etérea não diferenciado. Watts vê todas as distinções físicas como expressões da unidade.
  • A visão idealista da natureza – fundamentalmente, a visão de Watts da realidade é um idealismo, uma visão da realidade que diz que tudo o que existe é essencialmente espiritual/mental em sua composição. Ele diz que a sensação é o resultado de uma vibração interagindo com a mente – que sem a mente nosso mundo é vazio de luz, calor, peso, tempo e espaço. Para Watts a distinção entre bem vs mal não são descrições adequadas a realidade. Essa influencia de uma visão idealista da natureza influenciou a visão de Watts sobre um Deus pessoal. Deus já não é mais um Deus que se encontra fora do mundo guiando o universo. Para Watts, a distinção entre Deus/Mundo, assim como todos os outros conceitos, não é real.

Maya a ilusão do mundo

De acordo com algumas escolas hindu, nosso mundo é MAYA. Esse conceito trouxe muita confusão e até hoje é difícil de definí-lo. Shankara, um dos maiores mestres do Vedanta, achava que o monismo absoluto era “desgostoso’ , pois a realidade do mundo e das pessoas impressionava sua consciência. Ele então adotou o conceito de MAYA, que significa algo que aparenta ser real, como se fosse uma ilusão mágica (definição de Watts) – o universo é uma ilusão excitante e interessante. Sentimento de alívio, de que o mundo não é algo para ser levado a sério.

Criação – O universo foi criado pelo Ser que se encontra além da dualidade. Watts diz que o ato de criação de Deus foi espontaneo (não veio através de um plano). A criação para os panteístas é vista como sendo uma emanação da natureza. Para ele, a criação vem do nada, esse nada que contém possibilidades infinita (sunyata) – ele diz que sunyata é Deus. O mistério. A Criação não vem, portanto, da livre vontade de um Deus soberano mas sim da emanação espontanea do Ser de Deus.

O mundo foi criado a partir do Ser de Deus, sendo os humanos uma unica pessoa unificada. O Diabo e Deus seriam um?

Visão de que Deus está jogando um jogo de xadrez. Como fica a questão do mal/bom? Para ele, o bom e o mau é que nem cima/baixo, são apenas categorias abstratas, que nenhuma delas descrevem a realidade das coisas – elimina valores tradicionais morais.

A ilusão do ego

O ego individual gera ansiedade. Nossa forma de pensar acabou dividindo nossa experiencia unitiva em fatos separados. Implica que o ego do individuo não é uma entidade real. Uma das razões para fazer isso é que só assim você descobrirá a verdadeira realidade. Ele diz que um dos maiores desejos que o ser humano possui é de ter sua existência pessoal e argumenta que a ilusão do ego deve ser eliminada.

A redescoberta da unidade original veio pela experiencias dos místicos indianos e chineses que intuiram um senso de continuidade entre as profundezes da humanidade Atman e as profundezes do universo Brahman.

As religiões teístas do ocidente resistiram esse insight oriental por conta de sua dependencia a revelação como fonte de toda a verdade espiritual. De acordo com Watts, o protestantismo e o catolicismo trabalharam em conjunto para intensificar o sentimento de separação.

O budismo nos ensina que nos sofremos por conta de nosso apego aos objetos que são, por natureza, impermanentes.

O eterno self do universo está constantemente se movendo em ciclos nascimento-morte. A morte termina o sistema de memória chamado “eu” mas não o eu eterno, o eu verdadeiro.

Resumo

Para entendermos a visão de mundo de Watts, devemos considerar os seguintes fatores:

  • Para Watts, os místicos intuiram tanto a unidade do universo e a natureza polar do universo em muitos aspectos. Então, em contraste ao extremo monismo, o panteismo de watts inclui o principio de unidade e pluralidade dentro de unidade de Deus. O mundo está em Deus mas Ele não se exaure nele. Deus como a realidade última unifica todas as polaridades em um campo único.
  • Em segundo lugar, para Watts e para o panteísmo em geral, a criação de Deus é baseada na emanação e no flow espontaneo vindo do Ser de Deus. É contrario ao Deus YAHWEH que cria com liberdade e de acordo com sua vontade. O deus de Watts cria com base na espontaneidade e ao acaso.
  • Pessoas como individuos não existem. Todas as polaridade particulares são o Deus unificado que é o universo.

Watts e o Cristianismo

A filosofia Perene

A filosofia perene da uma evidência rasa para dar suporte a visão de muitos místicos que alegavam a unidade da realidade.

Watts alega que todos os místicos de todas as eras e tempos também intuíram a mesma visão que possui da realidade, um mesmo significado, que apesar de terem diferentes formas (devido ao contexto histórico diferente em que emergiram), Aldous Huxley pegou os tópicos comuns de várias escolas de misticismo e popularizou a noção de que todas essas escolas experienciaram a mesma realidade.

Ele pegou o termo Philosophia perennis (filosofia perene) de Leibniz para designar uma visão de mundo comum de todos esses pensadores. A critica que se pode fazer é: como as religiões, que possuem doutrinas diferentes entre si, podem significar a mesma coisa?

De acordo com Watts, confundimos a “forma” da religião com o “significado” da religião. A forma da religião geralmente contém certas doutrinas baseadas em eventos históricos – a forma vária de uma religião a outra, dependendo da base histórica daquela religião. Já o significado de todas as religiões é Deus, como uma realidade experiencial. O significado é igual em todas as religiões.

A Filosofia perene ensina que o significado permanece constante de uma religião a outra, independente de sua forma histórica.

O conteúdo da filosofia perene: Huxley identificou três áreas básicas de significado comum dos escritos dos místicos. O mais básico destes é a unidade metafísica da realidade, que reconhece que o mundo é unificado. O segundo pertence a área da psicologia e da antropologia – ele diz que a alma humana é idêntica a realidade divina. A terceira é na área da ética, a aquisição de conhecimento de nossa unidade com o Chão do Ser imanente e transcendente.

A tese central da filosofia perene é a de que todas as religiões contém o mesmo significado. De acordo com essa visão, as formas das religiões se diferenciam por conta de suas origens históricas divergentes e tais formas devem ser desconsideradas – o que importa é aprendermos o significado oculto por detrás das formas. Ele diz que todas as formas de religião são expressões de um significado único, uma doutrina, um mito que apareceu constantemente em todas as culturas. Jesus seria apenas uma encarnação do Eu unico, o “Eu sou”, Yahweh (o que os hindus chamam de avatar) como todas as outras pessoas.

Watss argumentou que os antigos Cristãos acreditavam na unificação do universo mas que devido a certas influências posteriores, os cristãos se esqueceram os insights originais de sua tradição.

O Cristianismo para Watts é a fonte do problema, pois acentuou o senso de divisão entre Deus e a Humanidade, para Watts, pelo fato do Cristianismo não ser uma religião mística, ela não é totalmente religiosa; – a igreja falhou em apresentar ao mundo a doutrina da consciência unificada – os padres são viciados nas formas das religiões mas não conseguiram captar a essência, seu verdadeiro significado.

O Verdadeiro Cristianismo para Watts começou com a consciência da unidade (que a característica da verdadeira religião). Para Watts, Cristo teve uma experiência forte de consciência cósmica, a experiência mística e intuitiva de unidade com Deus. Ele experimentou a realização de que todos nós somos uma manifestação do “Eu sou” da Bíblia.

Essa consciência da unidade com Deus é o que causou a crucificação de Cristo, pois em uma cultura em que YAHWEH era considerado radicalmente transcendente, experienciar a consciência cósmica era visto como blasfêmia. Se Cristo estivesse na Índia ele teria sido compreendido, pois os orientais compreendem que “Todos nós somos Deus disfarçado, jogando esconde-esconde consigo mesmo”

  • O verdadeiro significado da existência de Cristo é transformar a humanidade em Deus. A natureza divina dos humanos precisa ser despertada, para que descubram seu eu real.

A Religião cresceu em linhas previsíveis – a fase da criança inocente: enfatizava Deus-pai, quando nos tempos medievais aceitavamos a sabedoria vinda da autoridade externa e literal. Na fase da adolescência, temos um período de questionamento da autoridade (iniciado pela reforma protestante) e a segunda pessoa da trindade se tornou a mais importante de todas. Depois teve o movimento que iniciou o processo de abandono das religiões tradicionais e interesse no materialismo e crescimento imperialista. De acordo com Watss, estamos nos movendo para o estágio maduro na qual a sabedoria na qual a cultura foi formada será enfatizada – ênfase no espírito santo. Será enfatizada a união da alma com Deus, pois Deus sendo perdoador e amoroso, ele já nos aceitou com todos os nosso pecados e imperfeições, a outra será a enfase no amor como instrumento de combate e não no ódio e na violência e a moralidade virá da nossa compreensão de nossa união com Deus e não por meio de mandamentos.

Para Watts, quando atingirmos o estágio de maturação, começaremos a entender o significado real das doutrinas (formas) Cristãs. Para Watts, temos um entendimento errado da Criação (Ex nihilo). Whatts diz que o “nada” da criação (ex nihilo) vem do No-thing (sunyata)

  • Sunyata, na filosofia budista, a vacuidade que constitui a realidade última; sunyata é visto não como uma negação da existência, mas sim como a indiferenciação da qual surgem todas as entidades, distinções e dualidades aparentes. Sunyata seria Deus, que está além das dualidades.

Lembrança de si – a unidade que existe antes da separação do UM em MUITOS, antes da entrada de MAYA. O truque que Deus fez em si mesmo para fingir ser quem somos. A ilusão do ego, da individualidade separada, explode na descoberta de nosso eu eterno e original. A ilusão do ego se encerra quando descobrirmos que na verdade somos Deus, O Self, o Universo.

A Criação (ex nihilo)

“Ex nihilo” é latim para “do nada”. O termo “criação ex nihilo” refere-se a Deus criando tudo do nada. “No princípio, criou Deus os céus e a terra” (Gênesis 1:1). Antes daquele momento não havia nada. Deus não fez o universo a partir de blocos de construção preexistentes. Ele começou do zero.

A Bíblia nunca declara expressamente que Deus fez tudo do nada, mas está implícito. Em Hebreus 11:3, lemos: “Pela fé, entendemos que foi o universo formado pela palavra de Deus, de maneira que o visível veio a existir das coisas que não aparecem.” Os eruditos bíblicos entendem que isso significa que o universo veio a existir por ordem divina e não foi montado a partir de matéria ou energia preexistente.

O termo “criação ex nihilo” refere-se ao evento sobrenatural do começo do universo. Foi o momento em que Deus criou algo do nada.

Cristianismo vs Panteísmo (Incompatibilidade)

O Cristianismo é incompatível com a posição metafísica da realidade unificada. Uma pessoa não pode ser uma panteísta e uma Cristã Ortodoxa ao mesmo tempo! O Cristianismo tem um desgosto pela filosofia perene. Cristianismo afirma a distinção entre Criador vs Criatura.

Ou todos os homens e mulheres são Deus brincando de esconde-esconde ou existe uma diferença real entre Deus e sua Criação . Não dá para ter essas duas visões ao mesmo tempo.

  • O Cristianismo requer um comprometimento total com Jesus como a encarnação única de Deus. O fato de o Cristianismo dizer ser a verdade absoluta sobre como as coisas são não pode ser negado. Watts percebeu que uma escolha deve ser feita entre o Cristianismo e os insights da filosofia oriental.

Watts rejeita o Cristianismo Ortodoxo, pois o Cristianismo tende a pensar em Deus em termos de um Rei ou Patriarca. (que para Watts são uma linguagem ilusória) – o caracter de YAHWEH como rei, patriarca é rejeitado por Watts. Watts denuncia que o Cristianismo se corrompeu, parou de ensinar a seguir o exemplo de Jesus em como obter a consciência cósmica (suas boas novas foram pervertidas). Watts diz que a religião de Jesus era nos ensinar que, assim como ele, também somos filhos de Deus (“filhos” nesse caso significa compartilharmos da mesma natureza de Deus, de que somos um com Ele).

Para Watts, o cumprimento de nosso propósito de vida não se da no futuro e sim no agora, em reconhecermos que nenhum individuo realmente existe.

Watts Coloca as afirmações dogmaticas das religiões em um nível baixo e que a “verdadeira religião” só acontece quando abandonamos todos os dogmas, do sentimento de segurança que obtemos com o apego a dogmas, e que deixar ir as categorias descritivas é o caminho para a verdade.

Para Watts, O Cristianismo depende muito de seus dogmas e que apesar deles proverem seguranças, eles impedem o crescimento espiritual, bloqueando a intuição mística – as categorias descritivas deveriam dar lugar a percepção mística da unidade eterna de tudo o que existe.

Se o Cristianismo estiver correto, o Hinduismo não pode estar correto, pois o Cristianismo enfatiza a transcendencia de Deus e exclui a sua imanência.

O conceito hindu de atman, o eu individual, que é conectado a Brahman, o eu cósmico. Para os Hindus, a alma individual, o atman (que é um com Brahman, o universo) é uma substância imutável que se encontra detrás do reino das experiências.

Conhecimento da realidade

A realidade última para Watts se encontra além das distinções conceituais e só pode ser conhecida intuitivamente, por meio de experiências místicas. Tal intuição vem de um despertar espontâneo, uma experiência Satori (D.T Suzuki).

Satori é uma palavra japonesa para conhecimento, para Watts ela é o método chave pela qual a natureza da verdadeira realidade pode ser aprendida.

Koan – A técnica do Zen

Os místicos por muito desprezaram o valor do intelecto, para eles o único conhecimento válido é o adquirido por experiência intuitiva/mística. O zen repousa 100% no terreno da intuição, transcende as afirmações categóricas que são a base de toda a descrição e argumentação e reduz todo dogma, teoria e formalizações ao nível da inutilidade – pois são tudo ideias sobre a verdade.

Qualquer tentativa de conceitualizar a realidade última esta condenada ao fracasso. Palavras, teorias e ideias conceituais são irreais – os conceitos nunca serviram de substitutos adequados ao conhecimento intuitivo/imediato.

A apreensão da realidade vem por meio de uma experiencia pessoal e de primeira mão -uma abordagem experimental – a base da da sabedoria do oriente vem por meio de experimentos psicologicos de exploração de consciência.

Já a revelação é a base para os teólogos. Abordagem experimental vs revelatória – revelação reside na área do intelecto consciente, providenciando a mente dogmas a serem seguidos e entendidos. Para Watts a melhor visão de mundo é a da abordagem experimental (experimentação psicologica) e não de uma revelação fixa e arbitrária.

As contradições da experiencia descritiva devem ser rompidas para dar abertura a verdadeira realidade (quebrando as imagens intelectuais que temos da realidade). O Koan nos indica a natureza ilusórias das conceptualizações, da escravidão do pensar (é um meio de transcendermos a barreira do pensamento lógico). O Koan não pode ser respondido intelectualmente, toda a tentativa de uma resposta lógica leva o estudante Zen a um beco sem saída.

O método do Zen é de excitar e exaustar o intelecto, para fazê-lo perceber que a intelectualização é apenas pensamento. Ira provocar, irritar e exaustar as emoções até que seja percebido que a emoção é apenas um sentimento. Quando o discipulo chega nesse estado de impasse intelectual/emocional, ele passa de uma experiencia da realidade conceitualizada de segunda mão para uma experiencia de primeira mão.

Watts diz que o Cristianismo tem um Koan construido no núcleo de seu sistema.

  • A mensagem principal desses tipos de abordagem orientais é: não pense, não utilize seu intelecto discursivo, não utilize sua razão, pois o verdadeiro conhecimento está além de sua psique.

Satori – o coração do Zen

Depois de o Koan ter eliminado o conhecimento ilusório baseado na natureza dualísta e conceitual da mente, surge a oportunidade do conhecimento intuitivo e supra-conceitual o satori.

  • Watts alega que um dos principais problemas da sociedade é a dependencia do intelecto, que a atividade do pensamento aumentou e que ele dominou todas as nossas vidas, enquanto nosso conhecimento instintivo se atrofiou. A libertação da dualidade (que é inspirada pelo pensamento conceitual – que é o objetivo do Budismo de acordo com Watss) traz consigo uma nova forma de enxergar a realidade. Por isso, os adeptos do Zen não se consideram ateístas e nem panteístas, pois a aplicação desses termos implica uma dualidade que deve ser transcendida.

Com a eliminação do pensamento dualístico, não sobra ego que possa ser desejado por conta própria. O ego do individuo é como uma casca que se explode no momento do satori. O ego individual não é instantaneamente absorvido no UM-EGO. A individualidade da pessoa se torna “solta”, desapegada.

Satori foi definido como sendo uma visão intuitiva na natureza das coisas em contradição ao entendimento analítico/lógico das mesmas. Praticamente falando, satori abre as nossas portas de percepção para um mundo desconhecido, encoberto por conta de nossa mente dualística e confusa. O satori une todos os opostos e distinções em um todo orgânico. Alguém que experienciou satori vê o mundo de um angulo diferente.

Essencialmente satori é uma experiencia súbita que pode ser descrita como um “desligamento” da mente. Satori não pode ser definido conceitualmente, pois representa um conhecimento intuitivo da verdade do zen de que nada pode ser afirmado sobre o que é. É por essa mesma razão que mestres zen abandonaram suas atividades de fazerem afirmações sobre a realidade.

Watts descreve a experiencia satori como sinonima da conversão no Cristianismo, que surge na consciência do individuo após ele persistir e chegar ao seu limite com o Koan. Um dos aspectos mais importantes da experiencia Satori é sua natureza não cognitiva. A apreensão da realidade aprendida no Satori é diferente da do conhecimento obtido pelo discurso racional. O verdadeiro conhecimento do Satori é intuitivo e se encontra no significado por detrás das palavras/pensamentos.

Como atingir o satori

O zen interpreta o esforço ativo em direção ao satori como uma admissão da ilusão da separação. Alguém que busca ser um Buda (desperto) pressupõe uma dualidade entre si mesmo e Buda. Buscar a iluminação significa a admissão da não-iluminação. Watts conclui que isso é uma forma de loucura – no sentido de ser uma pessoa isolada do mundo.

A solução para isso não pode ser um esforço/ação positiva. Uma pessoa não pode tentar parar de tentar realizar o satori, pois tais esforço só alimentaria a ilusão. É necessário uma ação negativa para a obtenção do satori, o processo de deixar ir/desapego, através de uma realização de que não há nada para fazer. A melhor maneira de sair da ilusão do ego não é tentando com cada vez maior esforço sair dele.

Não mente: o objetivo do zen

O Budismo vê a extinção do desejo como o caminho último para escaparmos do sofrimento do mundo. O objetivo é chamado de Nirvana, o estado de conhecimento de que a realidade se encontra além da finitude e limites desse mundo.

A ideia do vazio e da vacuidade é bem conhecido por ser o objetivo do Budismo. O vazio do Zen é a vazio absoluto que transcende toda a dualidade: sujeito/objeto, vida/morte, Deus/mundo. Ela implica o não-tempo, não-espaço. O Sunyata zen é um zero cheio de possibilidades, um vazio de conteúdos infinitos. O Zen não é um teismo que contém um Ser para ser digno de ser adorado. Mesmo que não negue a existencia de um Deus, ele o engole/absorve em sunyata, removendo-o do terreno da investigação.

Uma substância no pensamento ocidental é uma realidade imutável que é subjacente aos acidentes, as características mutáveis. A diferença entre substância e acidentes pode ser encontrada na doutrina católica de transubstanciação, em que as substâncias do pão e do vinho são mudadas na substância do corpo e do sangue (apesar dos acidentes permanecerem pão e vinho).

O conceito de eu individual que muitos budistas seguem é diferente, pois acreditam na noção de anatman (não-mente, não eu). Essa visão assegura que não existe um sujeito imutavel por detras da experiencia. Quando alguém caminha, existe um processo holistico que não deve ser dividido em “caminhante” (o sujeito estático) e o caminhar (o processo ativo) – o caminhante é apenas uma abstração do processo total de caminhar. Watts aceita a noção budista de Anatman.

Tanto a visão metafisica hindu e budista podem ser classificadas como panteístas. No Hinduísmo, Brahman é o eu cósmico que é conectado com todos os “eus” individuais; já no modelo budista, toda a realidade é um único processo complexo de movimento e experiencia, sem um “eu” que se mantém constante durante todo o processo.

O conhecimento para Watts é baseado na experiencia mística. O verdadeiro conhecimento para os místico é inefável, é impossível encontrar as palavras certas para descrever tal experiencia – a resposta que é sempre dada as perguntas religiosas é o silêncio.

Uma avaliação de Watts

O Cristianismo é teista e é incompativel com o panteísmo. Esses dois mundos metafísicos excluem um ao outro. Nem todas as religiões são compativeis com a filosofia perene e isso se deve ao fato de que afirmações contraditória acerca da realidade não podem ser igualmente verdadeiras ao mesmo tempo.

Como averiguar qual dessas visões de mundo conflitante é verdadeira? Watts diz que não há formas satisfatórias de argumentar os méritos de uma religião contra as outras. Ele diz que no século XX é grosseiro afirmar que certa posição teologica e filosofia é a verdade e ainda mais tentar provar isso.

Watts nos da um critério para eliminar certas visões de mundo: a plausibilidade. O que significa uma visão de mundo ser plausível? Ela precisa explicar consistentemente toda a experiência humana! O fato de uma visão de mundo ser plausível não significa que ela é verdadeira!

  • Se alguém rejeita uma visão de mundo ou afirmação metafísica (pois contradiz a sua visão de mundo), tal pessoa está operando operando dentro do terreno da lógica (e validando a necessidade da lógica). Todo o grupo que diga possuir a Verdade implicitamente rejeita todas as afirmações que possam contradizer sua verdade.

A Crítica do Panteísmo

Segurar-se a visão panteísta requer certos sacrifícios, dentre os quais “todos os argumentos, para mostrar a existência de Deus, devem ser descartados”. Essa crítica ignora pontos muito importantes.

Um panteísta-místico como Watts pode negar que o intelecto pode dar algum tipo de conhecimento válido sobre algo real porém isso anularia a validade de sua própria visão de mundo. Muitos na história da filosofia que utilizaram de argumentos teístas atingiram algo além de um Deus transcendente.

O Panteísmo foi criticado por sua natureza idealista. O panteísmo identifica o pensamento e a existência e nos pede a rejeitar objetos materiais não pode ser concebido exceto como distinto de pensamentos. Os panteístas admitem que o seu sistema é idealista. Os Zen Budistas dizem que nenhum som é feito por uma arvore que cai exceto se tiver uma mente que ouve.

O panteísmo é equivalente ao ateísmo. Na prática, o panteísmo é um sistema ateísta de crenças, pois apesar de não negar absolutamente a existência de Deus, ele o remove do campo de investigação. Se Deus não o Criador Transcendente e pessoal mas sim tudo o que existe, então ele (a coisa) não é Deus. Alguns argumentam que o panteísmo é inadequado pois seu Deus não é pessoal. O Último no sistema panteísta é uma força, uma mente impessoal que cria espontaneamente por emanacionalmente, a partir de seu próprio Ser.

Alguns teístas afirmam que o Deus panteísta depende da Criação, pois se a criação é emanacional, então Criador não é soberano sobre o Universo mas faz parte dele (interdependencia do Criador com a Criação).

O Deus panteísta é infinito e finito ao mesmo tempo. “A ideia de que o mundo é uma auto-expressão de Deus é incompativel com sua infinitude e auto-existência. Se Deus compartilha de seu Ser com o mundo, ele deve ser limitado por ele. Se o mundo é contingente e se é uma parte de Deus, ele não pode ser necessário.”

  • O problema da comunicação pessoal. Outra critica ao panteísmo é que o panteísmo, por destruir a existência individual, também destroi o amor e a comunicação no universo (a visão da unidade da realidade). É necessário existir pessoas para se haver comunicação. Nós claramente experienciamos amor e comunicação e e temos um centro de decisão/vontade pessoal (com pensamentos, sentimentos e capacidade de escolher), então isso indica a existência de pessoas individuais.
  • Além do mais, como distinguir as experiencias de unidade e consciência cósmica e as experiencias ilusórias de egos separados que se comunicam e interagem com outros egos?
  • O panteísmo destroi o desejo religioso do ser humano ao eliminar a possibilidade de devoção/adoração a Deus. Oração, salvação são excluidas da possibilidade. Watts diz que não há relacionamento pessoal entre as pessoas e Deus pois a “pessoa” não existe. A inegavel existencia de seres humanos parace ser algo que o panteísmo não consegue responder. Muitas religiões orientais tem a visão de que o problema fundamental do ser humano é a ignorância – de que as pessoas estão inconscientes de quem verdadeiramente são – se esqueceram de que são “Um” com o universo. A salvação oriental, portanto é o conhecimento, um conhecimento que já estava dado (porém encoberto) – o conhecimento de que elas são o universo. As pessoas parecem querer algo a mais do que isso, uma necessidade maior do que é identificada pelos pensadores orientais. Desprezar ou ignorar a necessidade humana por significado além da experiência humana é ser desonesto intelectualmente. Muitas pessoas que vivem em sociedade orientais (nas quais a visão panteísta é forte) adoram uma divindade ou outra. Um exemplo primário pode ser encontrado na Índia na qual o teismo Bhakti (devoção) tem muitos aderentes. Watts argumenta que o impulso religioso deve ser eliminado.
  • Outros criticos do panteísmo argumentam que essa visão de mundo panteísta não explica a realidade do mal, sofrimento e morte no mundo. Dizer que o sofrimento é uma ilusão é filosoficamente inadequado e existencialmente superficial. Os panteistas argumentam que o sofrimento de alguém com cancer, um acidente ou uma doença do coração são partes da ilusão maior, o jogo cósmico na qual Deus esta brincando de esconde-esconde consigo mesmo em MAYA. O panteísmo elimina a distinção moral entre o bem e o mal. As pessoas se consideram agentes livres e se sentem responsáveis por suas condutas. Elas reconhecem um padrão de moralidade que precisam incorporar em suas vidas, mas o panteísmo ignora as categorias básicas da moralidade.

O panteísmo não pode explicar adequadamente a existência humana – como que seres humanos que pensam, sentem e falam como nós vieram a fazer parte do universo? O panteismo afirma a existência de seres finitos no mesmo ato de negar sua existência. A negação da existência dos seres humanos é impossível. O panteísta, ao mesmo tempo, não nega a validade de sua proposição pois tal afirmação é acreditada como sendo verdadeira. O panteista assume a confirma a existência dos seres humanos no mesmo ato de dizer que não existem. Para negar a existência de seres finitos, é necessária um centro de inteligência que faça tal nagação. Então, qual seria a natureza desses centros de inteligência? Os Budistas estão preocupados em negar substancialmente os egos existentes.

  • O panteista não explica nossa experiência como seres individuais e com egos finitos. Ele falha em explicar nossa consciência de que existem diferenças e autonomia em coisas e nas pessoas, formas independentes de existencia. Watts diz que nossa experiencia como individuos é ilusória. Para Watts a ilusão de Ego surgiu pois Deus, em seu jogo de esconde-esconde, simplesmente se esqueceu de quem ele é. Quando ele se lembrar de que ele é (e tal relembrança vem da experiencia mística de consciência cósmica), não existira mais problema em entender como o sentimento de separação e de individualidade é pura ilusão. Watts ignora a ampla evidencia da experiencia da identidade individual sentida por todas as pessoas e registrada a longo de toda história humana. Qual é a mais forte, a evidência da existência de identidades individuais ou a evidência da inexistência da identidade individual derivada de casos de experiências místicas de unidade? Considerar a evidência de experiências místicas de unidade e a evidência das experiencias mais comuns de separação e comunidade é ser desonesto, pois você está tirando uma conclusão forçada em favor de uma visão de mundo particular (e não deixando as evidências determinarem a conclusão). Por que a maior parte dos seres humanos nunca teve uma experiencia de consciência cósmica?
  • Oferecer a explicação de toda a existência individual humana (incluindo os pensamentos, sentimentos, fala, amor) como sendo um jogo celestial de esconde-esconde é inadequado. É dificil acreditar que toda a existência humana possa ser explicada de forma tão simplista.

“Se todo o universo é sem sentido, até a própria afirmação dele ser sem sentido é sem sentido. Se o mundo é armadilha, até o próprio acusador também é uma armadilha”.

A visão de mundo panteista tem muitos paradoxos e dificuldades. Por exemplo, se nossa união com Deus é para ser perfeita, então ela deve ser inseparavel e intima. Mas se Deus for realmente Deus, então ele deve estar acima e além do universo. Se Deus é a fonte da vida e do poder criativo, ele tem que ser uma pessoa. Mas se ele á a realidade última, então ele deve ser livre da mutabilidade e limitação da personalidade.

Critica da visão de Watts sobre o Cristianismo

Aceitar a filosofia perene é rejeitar o cristianismo. O cristianismo, em nenhum momento, tomou consciência de si como um dos muitos caminhos para Deus. Ele sempre foi uma fé que requer um comprometimento total com Cristo como a única encarnação e revelação de Deus.

A filosofia perene- De acordo com Huxley, ela consiste em um núcleo comum de intuição acumulado pelos místicos de todas as eras que reconhecem uma realidade divina dentro do mundo. Watts concorda com a visão perene.

O argumento de que existe um sistema unificado de crença suportado pelas experiencias místicas de todas as culturas de todos os tempos é questionavel. O problema principal da filosofia perene é a largura das afirmações teológicas e filosoficas feitas por tais pessoas e a filosofia perene falha em explicar como todos eles são a mesma coisa. William James comenta: “Muitos homens, muitas mentes: eu imagino que essas experiencias são infinitamente variaveis, do mesmo modo como são as idiossincrasias de cada individuo”. A experiencia mística é irredutivel a um núcleo comum de verdade e parece impossivel reconciliar todas as afirmações divergentes dos vários místicos, de forma a dar validade a uma visão de mundo especifica. Uma epistemologia mística pode ser problematica.

É possivel argumentar que toda a experiencia vá para a grade da mente conforme é apreendida. Muitos argumentam que toda a experiencia (seja ela emocional, física, sensorial ou mística) passa pelos filtros da mente e é interpretada por ela – não existe algo como uma experiência pura. Muitos místicos tendem a manter teorias sobre a realidade que já acreditavam antes mesmo da experiência mística – isso indica o papel influente que as noções que mantemos em mente exercem sobre a nossa compreensão – a experiencia mística, portanto, não é pura e inafetada pelas noções que a mente carrega.

Um outro problema se do grau de certeza de tais experiencias. Em uma corte, uma testemunha que diga com vigor “Eu estou certo de que tal pessoa é culpada” não tem nenhum valor sem dar uma resposta adequada a questão do “porquê” ela acredita que tal pessoa é culpada. Não é suficiente dizer: “Eu sinto que é verdade” Aqueles que julgam o caso precisam ouvir uma explicação/descrição precisa que levaram a crença de que a pessoa acusada é culpada. Além do mais, se uma outra testemnha dizer outra coisa a respeito do acusador que contradiga o que ela acabou de falar, isso coloca em xeque a validade de suas afirmações. As experiencias místicas sofrem pois são muito particulares e privadas. Se todos os místicos tivessem experiências iguais, com características similares e que chegassem as mesmas conclusões, poderia ter alguma validade intersubjetiva. Porém, o nível de concordância entre os muitos místicos é muito pequeno. Além disso, as experiências místicas não providenciam uma certeza psicologica. Nas palavras do própria Huxley em sua experiencia mística:

“A coisa inteira foi muito estranha pois de certa forma foi muito boa mas de outra foi absolutamente aterrorizante, mostrando que quando alguém pensa que foi além de si mesmo, ele na realidade não foi… Eu comecei com esse sentimento de maravilhoso de presente cósmico e terminei com um sentimento terrível de que qualquer um pode ser enganado… Foi um insight, mas ao mesmo tempo o mais terrível dos erros na medida em que alguém estava adorando a si mesmo”

Aldous Huxley

É como se Huxley tivesse se enganado, acreditando que obtivera uma sabedoria transcendente quando no entanto tudo isso não passou de uma inflação de seu ego, uma adoração de si mesmo.

Outra questão é o fato de ser os místicos conseguiram expressar corretamente suas experiências internas, sobre a veracidade de seus relatos. A experiencia foi relatada corretamente? Mesmo que fosse, a demonstração desse fato seria impossivel.

Como foi falado sobre a filosofia perene, o núcleo de verdade comum que pode ser encontrada entre os relatos místicos é pequeno. Eles dizem que seu conhecimento é inefavel e que tudo o que a mente dualista tentar fazer é errado e falso e que o verdadeiro conhecimento se encontra além dos conhecimentos categoricos.

Os místicos, ao tentarem ser relaxados com a lógica e rejeitá-la, ao tentar negar a validade da lógica, estamos usando, sem perceber, a lógica no processo. As leis da lógica são as formas pelas quais falamos e pensamos. Toda a tentativa de refutar a validade da lógica precisa utilizar da própria lógica em sua refutação. Todos nós, seres humanos, não pensamos, falamos ou sabemos nada sobre o universo que não esteja fundamentado nas leis da lógica. Todas as tentativas de negar as leis da lógica são autoderrotantes.

Uma das dificuldades do panteismo é sua incapacidade de explicar a experiencia humana de existência como egos finitos. Se alguém assume a visão panteista a priori, toda a evidência que contrarie o sistema de crença é considerado invalido. Mas se a pessoa começar com a consciência ordinária da vida humana, parece que são poucas as pessoas que chegariam a conclusão de que a existência humana é apenas uma ilusão. Watts sugere que o jogo cósmico de esconde-esconde que Deus brinca consigo mesmo como explicação definitiva, ignorando a evidência da experiencia comum, de que existimos como individuos finitos.

Uma apologia final

Apesar de um universo que transcenda nossas formas de pensar e falar sempre permanece uma possibilidade lógica, uma afirmação de “saber” algo além desses modelos produz grandes dificuldades. Quando Watts afirma saber que a sua posição panteista é verdadeira, ele argumenta que Deus (a realidade última) não é conhecido por processos intelectuais pois Deus é indescritível e inefável. Isso não significa que Deus seja desconhecido, mas que ele é desconhecido por pensamentos. Deus só pode ser descoberto e conhecido pela experiencia intuitiva ou por uma consciência imediata de união com Deus.

Realizar a afirmação “Deus é desconhecido pela intelecção” é algo que gera grandes problemas. Se Deus é desconhecido pela inteleção, então a própria afirmação (que diz saber algo sobre Deus “que ele não é conhecido pelo intelecto” é falsa. A teoria de que a realidade não pode ser conhecida pelo intelecto é autocontraditória, pois tal teoria está afirmando saber algo sobre a realidade – que ela não é conhecível – rejeição de declarações acerca da realidade

Allan Watts diz varias vezes sobre a Realidade, Deus e o Agora Eterno e que tais coisas estão além da compreensão intelectual, da fala. etc. “O absoluto está por detras do relativo, o significado por detrás das palavras e pensamentos”

Ele diz que as declarações dogmaticas e teologicas, assim como qualquer outra afirmação que use lógica, são sem significado (apesar de eles se utilizar da lógica para elaborar suas afirmações e ele próprio faz declarações dogmáticas) – ele publicou cerca de 25 livros cheios de declarações de todo o tipo – se toda a asserção é, por sua própria natureza, incoerente com a realidade, então porquê ele foi escrever sobre filosofia? Se as declarações não valem nada, para que escrever?

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