Neste livro, o Dr. Frankl descreve a experiência que o levou à descoberta da logoterapia. Prisioneiro durante longo tempo em campos de concentração, onde seres humanos eram tratados de modo pior do que se fossem animais ele se viu reduzido aos limites entre o ser e o não-ser.
Viktor Frankl nos ensina, por meio de sua própria experiência nos campos de concentração que a vida tem um sentido potencial sob quaisquer circunstâncias, mesmo as mais miseráveis. É possível “dizer sim à vida” apesar de todos os aspectos trágicos da existência humana.
Pelo seu próprio exemplo pessoal e de muitos outros exemplos heroicos, foi demonstrado a influência criativa que temos sobre a realidade, as quais não deixam de existir mesmo no campo de concentração,
O livro é dividido em 2 partes: Primeiro o autor apresenta seu relato autobiográfico (“Experiências num Campo de Concentração”), que serve como validação existencial das teorias apresentadas na segunda parte “Conceitos Fundamentais de Logoterapia” em que Viktor Frankl focaliza a lição que o leitor pode ter tirado da primeira parte e apresenta sua teoria sobre o sentido da vida.
A “essência” da logoterapia, a filosofia que ele desenvolveu e mais tarde ensinou, é que muitas das chamadas doenças mentais e emocionais são na realidade sintomas de uma sensação subjacente de vazio ou falta de significado. A logoterapia elimina esse vazio, ajudando o indivíduo a detectar o seu significado único, sua missão no mundo.
No campo de concentração todas as circunstâncias conspiram para fazer o prisioneiro perder seu controle. Todos os objetivos comuns da vida estão desfeitos. A única coisa que sobrou é “a última liberdade humana” – a capacidade de escolher a atitude pessoal que se assume diante de determinado conjunto de circunstâncias”
Ele podia decidir, dentro de si, como tudo aquilo iria afetá-lo. Entre o que acontecia com ele, ou o estímulo, e sua reação, estava a sua liberdade ou o seu poder de escolher qual seria a sua resposta.
Encontrando o significado por trás do sofrimento
A vida é sofrimento, e sobreviver é encontrar significado na dor, se há, de algum modo, um propósito na vida, deve haver também um significado na dor e na morte. Mas pessoa alguma é capaz de dizer o que é este propósito. Cada um deve descobri-lo por si mesmo, e aceitar a responsabilidade que sua resposta implica.
Se tiver êxito, continuará a crescer apesar de todas as indignidades. Frankl gosta de citar esta frase de Nietzsche: “Quem tem por que viver pode suportar quase qualquer como.“
“Também há sentido naquela vida que – como no campo de concentração – dificilmente oferece uma chance de se realizar criativamente e em termos de experiência, mas que lhe reserva apenas uma possibilidade de configurar o sentido da existência, precisamente na atitude com que a pessoa se coloca face à restrição forçada de fora sobre seu ser.
Faz muito que o recluso está privado do gozo da vida criativa. Mas não é só a vida criativa e o gozo de seus dons que têm sentido. Se é que a vida tem sentido, também o sofrimento necessariamente o terá. Afinal de contas o sofrimento faz parte da vida, de alguma forma, do mesmo modo que o destino e a morte. Aflição e morte fazem parte da existência como um todo”
Viktor Frankl
Frankl também diz que até mesmo na pior situação exterior que se possa imaginar, numa situação em que a pessoa não pode realizar-se através de alguma conquista, numa situação em que sua conquista pode consistir unicamente num sofrimento reto, num sofrimento de cabeça erguida, nesta situação a pessoa pode realizar-se na contemplação amorosa da imagem espiritual que ela porta dentro de si da pessoa amada.
Quando um homem descobre que seu destino é sofrer, tem que ver neste sofrimento uma tarefa sua e única. Mesmo diante do sofrimento, a pessoa precisa conquistar a consciência de que ela é única e exclusiva em todo o cosmo-centro deste destino sofrido. Ninguém pode assumir dela isso, e ninguém pode substituir a pessoa no sofrimento. Mas na maneira como ela própria suporta este sofrimento está também a possibilidade de uma vitória única e singular.
Viktor Frankl dá o seguinte exemplo de como podemos encarar o sofrimento sob uma nova perspectiva:
Certa vez um clínico geral de mais idade veio consultar-me por causa de uma depressão muito profunda. Ele não conseguia superar a perda de sua mulher, que falecera fazia dois anos e a qual ele amara acima de tudo. Bem, como poderia eu ajudá-lo? Que poderia lhe dizer? Abstive-me de lhe dizer qualquer coisa e, ao invés, confrontei-o com a pergunta: “Que teria acontecido, doutor, se o senhor tivesse falecido primeiro e sua esposa tivesse que lhe sobreviver?”
“Ah,” disse ele, “isso teria sido terrível para ela; ela teria sofrido muito!” Ao que retruquei: “Veja bem, doutor, ela foi poupada deste sofrimento e foi o senhor que a poupou dele; mas agora o senhor precisa pagar por isso sobrevivendo a ela e chorando a sua morte.” Ele não disse uma palavra, apertou a minha mão e calmamente deixou meu consultório. Sofrimento de certo modo deixa de ser sofrimento no instante em que encontra um sentido, como o sentido de um sacrifício.
Um dos princípios fundamentais da logoterapia está em que a principal preocupação da pessoa humana não consiste em obter prazer ou evitar a dor, mas antes em ver um sentido em sua vida. Esta é a razão por que o ser humano está pronto até a sofrer, sob a condição, é claro, de que o seu sofrimento tenha um sentido.
O autor também diz que o sentido é possível mesmo a despeito do sofrimento – desde que, naturalmente, o sofrimento seja inevitável. Se ele fosse evitável, no entanto, a coisa significativa a fazer seria eliminar a sua causa, fosse ela psicológica, biológica ou política. Sofrer desnecessariamente é masoquista e não heroico.
Ao aceitar esse desafio de sofrer com bravura, a vida recebe um sentido até o seu derradeiro instante, mantendo este sentido literalmente até o fim. Mesmo uma vítima sem recursos, numa situação sem esperança, enfrentando um destino que não pode mudar, pode erguer-se acima de si mesma, crescer para além de si mesma e, assim, mudar-se a si mesma. Pode transformar a tragédia pessoal em triunfo.
A Última Liberdade Humana
Onde fica a liberdade humana? E no campo de concentração? Não haveria ali um mínimo de liberdade interior (geistg) no comportamento, na atitude frente às condições ambientais ali encontradas? Será que a pessoa nada mais é que um resultado da sua constituição física, da sua disposição caracterológica e da sua situação social?
E, mais particularmente, será que as reações anímicas da pessoa a esse ambiente socialmente condicionado do campo de concentração estariam de fato evidenciando que ela nem pode fugir às influências desta forma de existência às quais foi submetida à força? Precisa ela necessariamente sucumbir a essas influências?
Será que ela não pode reagir de outro modo, “por força das circunstâncias”, por causa das condições de vida reinantes no campo de concentração?
A experiência da vida no campo de concentração mostrou-me que a pessoa pode muito bem agir “fora do esquema”. Haveria suficientes exemplos, muitos deles heroicos, que demonstraram ser possível superar a apatia e reprimir a irritação; e continua existindo, portanto, um resquício de liberdade do espírito humano, de atitude livre do eu frente ao meio ambiente, mesmo nessa situação de coação aparentemente absoluta, tanto exterior como interior.
Quem dos que passaram pelo campo de concentração não saberia falar daquelas figuras humanas que caminhavam pela área de formatura dos prisioneiros, ou de barracão em barracão, dando aqui uma palavra de carinho, entregando ali a última lasca de pão? E mesmo que tenham sido poucos, não deixam de constituir prova de que no campo de concentração se pode privar a pessoa de tudo, menos da liberdade última de assumir uma atitude alternativa frente às condições dadas.
A cada dia, a cada hora no campo de concentração havia milhares de oportunidades de concretizar esta decisão interior, uma decisão da pessoa contra ou a favor da sujeição aos poderes do ambiente que ameaçavam privá-la daquilo que é a sua característica mais intrínseca – sua liberdade – e que a induzem, com a renúncia à liberdade e à dignidade, a virar mero joguete e objeto das condições externas, deixando-se por elas cunhar um prisioneiro “típico” do campo de concentração.
Aquilo que sucede interiormente com a pessoa, aquilo em que o campo de concentração parece “transformá-la”, revela ser o resultado de uma decisão interior. Em princípio, portanto, toda pessoa, mesmo sob aquelas circunstâncias, pode decidir de alguma maneira no que ela acabará dando, em sentido espiritual: um típico prisioneiro de campo de concentração, ou então uma pessoa humana, que também ali permanece sendo ser humano e conserva a sua dignidade.
Ninguém pense que essas reflexões estejam distantes da realidade da vida e do mundo. Sem dúvida, poucas e raras são as pessoas capazes e à altura dessa elevada proposta. Pois poucos foram os que no campo de concentração mantiveram a sua plena liberdade interior e puderam alçar-se à realização daqueles valores possibilitada pelo sofrimento.
E mesmo que tivesse sido um único apenas – ele bastaria como testemunho para o fato de que a pessoa interiormente pode ser mais forte que seu destino exterior, e isto não somente no campo de concentração. Sempre e em toda parte a pessoa está colocada diante da decisão de transformar a sua situação de mero sofrimento numa produção interior de valores.
Dissemos acima que a razão última para a deformação da realidade vital interior da pessoa no campo de concentração não está nas causas psicofísicas enumeradas, mas que ela se origina, em última análise, numa livre decisão.
A observação psicológica dos reclusos, no campo de concentração, revelou em primeiro lugar que somente sucumbe às influências do ambiente no campo, em sua evolução de caráter, aquele que entregou os pontos espiritual e humanamente. Mas somente entregava os pontos aquele que não tinha mais em que se segurar interiormente!
Essas pessoas estão se esquecendo de que muitas vezes é justamente uma situação exterior extremamente difícil que dá à pessoa a oportunidade de crescer interiormente para além de si mesma. Em vez de transformar as dificuldades externas da vida no campo de concentração numa prova de sua força interna, elas não levam a sério a existência atual, e depreciam-na para algo sem real valor.
Naturalmente são poucas as pessoas capazes para isso; mas elas conseguiram, mesmo no fracasso exterior e mesmo na morte, alcançar uma grandeza humana que antes, em sua existência cotidiana, talvez jamais lhes tivesse sido concedida.
Poderíamos dizer que a maioria das pessoas no campo de concentração acreditava terem perdido as verdadeiras possibilidades de realização, quando na realidade elas consistiam justamente naquilo que a pessoa fazia dessa vida no campo: vegetar como os milhares de prisioneiros ou, como uns poucos, vencer interiormente.
O autor comenta sobre um pressuposto errôneo e perigoso, que ele chama de “pandeterminismo”, que é à visão do ser humano que descarta a sua capacidade de tomar uma posição frente a condicionantes quaisquer que sejam.
O ser humano não é completamente condicionado e determinado; ele mesmo determina se cede aos condicionantes ou se lhes resiste. Isto é, o ser humano é autodeterminate, em última análise. Ele não simplesmente existe, mas sempre decide qual será a sua existência, o que ele se tornará no momento seguinte.
O ser humano, em última análise, se determina a si mesmo. Aquilo que ele se torna – dentro dos limites dos seus dons e do meio ambiente – é ele que faz de si mesmo.
No campo de concentração, por exemplo, nesse laboratório vivo e campo de testes que ele foi, observamos e testemunhamos alguns dos nossos companheiros se portarem como porcos, ao passo que outros agiram como se fossem santos. A pessoa humana tem dentro de si ambas as potencialidades; qual ser concretizada, depende de decisões e não de condições.
Como o próprio Viktor Frankl disse:
“Sendo professor em dois campos, neurologia e psiquiatria, sou plenamente consciente de até que ponto o ser humano está sujeito às condições biológicas, psicológicas e sociológicas. Mas além de ser professor nestas duas áreas sou um sobrevivente de quatro campos – campos de concentração – e como tal também sou testemunha da surpreendente capacidade humana de desafiar e vencer até mesmo as piores condições concebíveis“
A Importância da Fé no Futuro
Quem não consegue mais acreditar no futuro – seu futuro – está perdido no campo de concentração. Com o futuro, tal pessoa perde o apoio espiritual, deixa-se cair interiormente e decai física e psiquicamente
Toda tentativa de restabelecer interiormente as pessoas no campo de concentração pressupõem que, consigamos orientá-los para um alvo no futuro. Isso é o traduzido pelas palavras de Nietzsche: “Quem tem por que viver aguenta quase qualquer como“.
O autor diz:
“Ouso dizer que nada no mundo contribui tão efetivamente para a sobrevivência, mesmo nas piores condições, como saber que a vida da gente tem um sentido. Há muita sabedoria nas palavras de Nietzsche: “Quem tem por que viver suporta quase todo como. Nos campos de concentração nazistas poder-se-ia ter testemunhado que aqueles que sabiam que havia uma tarefa esperando por eles, tinham as maiores chances de sobreviver“
Portanto era preciso conscientizar os prisioneiros, à medida em que era dada a oportunidade, do “porquê” de sua vida, do seu alvo, para assim conseguir que eles estivessem também interiormente à altura do terrível “como” da existência presente, resistindo aos horrores do campo de concentração.
E, inversamente, ai daquele que não via mais a meta diante de si em sua vida, cuja vida não tinha mais conteúdo, mas perdia o sentido de sua existência e assim todo e qualquer motivo para suportar o sofrimento. Essas pessoas perdiam a estrutura e deixavam-se cair muito cedo. A expressão típica com que replicavam a toda e qualquer palavra animadora era sempre a mesma: “Não tenho mais nada a esperar da vida”.
O fato de que cada indivíduo não poder ser substituído nem representado é, no entanto, aquilo que, levado ao nível da consciência, ilumina em toda a sua grandeza a responsabilidade do ser humano por sua vida e pela continuidade da vida.
A pessoa que se deu conta dessa responsabilidade em relação à obra que por ela espera ou perante o ente que a ama e espera, essa pessoa jamais conseguirá jogar fora a sua vida. Ela sabe do “porquê” de sua existência – e por isso também conseguirá suportar quase todo “como”.
O Sentido da Vida
O que se faz necessário aqui é uma viravolta em toda a colocação da pergunta pelo sentido da vida. Precisamos aprender e também ensinar às pessoas em desespero que a rigor nunca e jamais importa o que nós ainda temos a esperar da vida, mas sim exclusivamente o que a vida espera de nós. Falando em termos filosóficos, se poderia dizer que se trata de fazer uma revolução copernicana.
Não perguntamos mais pelo sentido da vida, mas nos experimentamos a nós mesmos como os indagados, como aqueles aos quais a vida dirige perguntas diariamente e a cada hora – perguntas que precisamos responder, dando a resposta adequada não através de elucubrações ou discursos, mas apenas através da ação, através da conduta correta.
Em última análise, viver não significa outra coisa que arcar com a responsabilidade de responder adequadamente às perguntas da vida, pelo cumprimento das tarefas colocadas pela vida a cada indivíduo, pelo cumprimento da exigência do momento.
Essa exigência, e com ela o sentido da existência, altera-se de pessoa para pessoa e de um momento para o outro. Jamais, portanto, o sentido da vida humana pode ser definido em termos genéricos, nunca se poderá responder com validade geral a pergunta por este sentido.
A vida como a entendemos aqui não é nada vago, mas sempre algo concreto, de modo que também as exigências que a vida nos faz sempre são bem concretas. Esta concreticidade está dada pelo destino do ser humano, que para cada um sempre é algo único e singular.
Nenhum ser humano e nenhum destino pode ser comparado com outro; nenhuma situação se repete. E em cada situação a pessoa é chamada a assumir outra atitude. Para a sua situação concreta exige dela que ela aja, ou seja, que ela procure configurar ativamente o seu destino; ora, que ela aproveite uma oportunidade para realizar valores simplesmente vivenciando (por exemplo, gozando); outra vez, que ela simplesmente assuma o seu destino.
Mas sempre é assim que toda e qualquer situação se caracteriza, por esse caráter único e exclusivo que somente permite uma única resposta correta à pergunta contida na situação concreta.
A busca do indivíduo por um sentido é a motivação primária em sua vida, e não uma “racionalização secundária” de impulsos instintivos. Esse sentido é exclusivo e específico, uma vez que precisa e pode ser cumprido somente por aquela determinada pessoa.
A vontade de sentido também pode ser frustrada; neste caso a logoterapia fala de “frustração existencial”
Frustração existencial pode resultar em neuroses. Para esse tipo de neuroses a terapia cunhou o termo “neuroses noogênicas“, a contrastar com as neuroses na significação habitual da palavra, isto é, as neuroses psicogênicas que é a incapacidade de encontrar um significado e um sentido de responsabilidade em sua existência.
Neuroses noogênicas têm sua origem não na dimensão psicológica, mas antes na dimensão “noológica” (do termo grego noos que significa “mente”) da existência humana. Este é outro conceito logoterapêutico que designa qualquer coisa pertinente à dimensão especificamente humana.
Há um impacto benéfico da orientação para o sentido – muitas pessoas se queixam atualmente da total e extrema falta de significado em suas vidas, elas carecem da consciência de um sentido pela qual valesse a pena viver. Elas se sentem perseguidas pela experiência de seu vazio interior – que o Viktor Frankl dá o nome de Vácuo Existencial.
O vácuo existencial se manifesta principalmente num estado de tédio.
É concreto que atualmente o tédio está causando e certamente trazendo aos psiquiatras mais problemas de que o faz a angústia. E estes problemas estão se tornando cada vez mais agudos, uma vez que o crescente processo de automação provavelmente conduzirá a um aumento enorme nas horas de lazer do trabalhador médio. Lastimável é que muitos deles não saberão o que fazer com seu tempo livre.
Neuroses noogênicas não surgem de conflitos entre impulsos e instintos, mas de problemas existenciais. Entre esses problemas, a frustração da vontade de sentido desempenha papel central. É óbvio que em casos noogênicos a terapia apropriada e adequada não é a psicoterapia de um modo geral, mas antes a logoterapia; ou seja, uma terapia que ousa penetrar na dimensão especificamente humana.
“A saúde mental está baseada em certo grau de tensão, tensão entre aquilo que já se alcançou e aquilo que ainda se deveria alcançar, ou o hiato entre o que se é e o que se deveria vir a ser. Essa tensão é inerente ao ser humano e por isso indispensável ao bem-estar mental. Não deveríamos, então, hesitar em desafiar a pessoa com um sentido em potencial a ser por ela cumprido. Somente assim despertaremos do estado latente a sua vontade de sentido.
O que o ser humano realmente precisa não é um estado livre de tensões, mas antes a busca e a luta por um objetivo que valha a pena, uma tarefa escolhida livremente. O que ela necessita não é descarga de tensão a qualquer custo, mas antes o desafio de um sentido em potencial à espera de seu cumprimento.
O que o ser humano precisa não é de homeostase, mas daquilo que chamo de “noodinâmica”, isto é, da dinâmica existencial num campo polarizado de tensão, onde um pólo está representado por um sentido a ser cumprido e o outro pólo, pela pessoa que deve cumprir.“
O sentido da vida difere de pessoa para pessoa, de um dia para outro, de uma hora para outra. O que importa, por conseguinte, não é o sentido da vida de um modo geral, mas antes o sentido específico da vida de uma pessoa em um dado momento. Formular esta questão em termos gerais seria comparável a perguntar a um campeão de xadrez: “Diga-me, mestre, qual o melhor lance do mundo?”
Simplesmente não existe algo como o melhor lance ou um bom lance à parte de uma situação específica num jogo e da personalidade peculiar do adversário. O mesmo é válido para a existência humana. Não se deveria procurar um sentido abstrato da vida.
Cada qual tem sua própria vocação ou missão específica na vida; cada um precisa executar uma tarefa concreta, que está a exigir cumprimento. Nisto a pessoa não pode ser substituída, nem pode sua vida ser repetida. Assim, a tarefa de cada um é tão singular como a sua oportunidade específica de levá-la a cabo.
De acordo com a logoterapia, podemos descobrir este sentido na vida de três diferentes formas:
- Criando um trabalho ou praticando um ato.
- Experimentando algo ou encontrando alguém, como a bondade, a verdade e a beleza, experimentando a natureza e a cultura ou, ainda, experimentando outro ser humano em sua originalidade própria – amando-o.
- Pela atitude que tomamos em relação ao sofrimento inevitável: podemos encontrar sentido na vida quando nos confrontamos com uma situação sem esperança, quando enfrentamos uma fatalidade que não pode ser mudada. Porque o que importa, então, é dar testemunho do potencial especificamente humano no que ele tem de mais elevado, e que consiste em transformar uma tragédia pessoal num triunfo, em converter nosso sofrimento numa conquista humana. Quando já não somos capazes de mudar uma situação – podemos pensar numa doença incurável, como um câncer que não se pode mais operar – somos desafiados a mudar a nós próprios.
A Bondade humana pode ser encontrada em todos
Afirmar que alguém fazia parte da guarda do campo de concentração, ou que foi prisioneiro no campo não quer dizer nada. A bondade humana pode ser encontrada em todas as pessoas e ela se acha também naquele grupo que à primeira vista deveria ser sumariamente condenado. Não podemos simplificar as coisas dizendo: “Os prisioneiros são anjos, e os guardas são demônios”.
Pelo contrário. Contrariando o que de modo geral é sugerido pela vida no campo de concentração, ser guarda ou supervisor e ter uma atitude humana para com os prisioneiros sempre será de certa forma um mérito pessoal e moral.
Em contrapartida, é particularmente deplorável a baixeza do prisioneiro que inflige um mal a seus próprios companheiros de dor. É claro que essa falta de caráter é mais dolorosa para os reclusos, da mesma forma como um prisioneiro que é alvo do mais insignificante gesto humano que lhe fizer um integrante da guarda fica profundamente comovido.
De tudo isso podemos aprender que existem sobre a terra duas raças humanas e realmente apenas essas duas: a “raça” das pessoas direitas e a das pessoas torpes. Ambas as “raças” estão amplamente difundidas. Insinuam-se e infiltram-se em todos os grupos; não há grupo constituído exclusivamente de pessoas direitas nem unicamente de pessoas torpes. Neste sentido não existe grupo de “raça pura”, e assim também havia uns e outros sujeitos decentes no corpo da guarda.
“O que é, então, um ser humano? É o ser que sempre decide o que ele é. É o ser que inventou as câmaras de gás; mas é também aquele ser que entrou nas câmaras de gás, ereto, com uma oração nos lábios.”
Conceitos fundamentais da Logoterapia
A logoterapia, ou, como tem sido chamada por alguns autores, a “Terceira Escola Vienense de Psicoterapia”, concentra-se no sentido da existência humana, bem como na busca da pessoa por este sentido. A logoterapia considera sua tarefa ajudar o paciente a encontrar sentido em sua vida.
Um paciente, pergunta ao Viktor Frankl a respeito da logoterapia:
“Poderia o senhor dizer-me, numa única sentença, o que quer dizer logoterapia, ao menos qual a diferença entre psicanálise e logoterapia?”
“Sim” – Viktor Frankl responde, “mas, em primeiro lugar, pode o senhor dizer-me com uma só sentença o que pensa ser a essência da psicanálise?”
O paciente responde o seguinte: “Durante a psicanálise o paciente precisa deitar-se num sofá e contar coisas que às vezes são muito desagradáveis de se contar.”
Viktor Frankl responde com o seguinte improviso: “Bem, na logoterapia o paciente pode ficar sentado normalmente, mas precisa ouvir certas coisas que às vezes são muito desagradáveis de se ouvir.”
Comparada à psicanálise, a logoterapia é menos retrospectiva e menos introspectiva. A logoterapia se concentra mais no futuro, ou seja, nos sentidos a serem realizados pelo paciente em seu futuro. (A logoterapia é, de fato, uma psicoterapia centrada no sentido.)
Para a logoterapia, a busca de sentido na vida da pessoa é a principal força motivadora no ser humano. Por esta razão costumo falar de uma vontade de sentido, a contrastar com o princípio do prazer (ou, como também poderíamos chamá-lo, a vontade de prazer) no qual repousa a psicanálise freudiana, e contrastando ainda com a vontade de poder, enfatizada pela psicologia adleriana através do uso do termo “busca de superioridade”.
Ao mesmo tempo a logoterapia tira do foco de atenção todas aquelas formações tipo círculo vicioso e mecanismos retro-alimentadores que desempenham papel tão importante na criação de neuroses. Assim é quebrado o autocentrismo típico do neurótico, ao invés de se fomentá-lo e reforçá-lo constantemente.
A logoterapia diverge da psicanálise na medida em que considera o ser humano um ente cuja preocupação principal consiste em cumprir um sentido, e não na mera gratificação e satisfação de impulsos e instintos, ou na mera reconciliação dos reclamados conflitantes de id, ego e superego, ou na mera adaptação e no ajustamento à sociedade e ao meio ambiente.
A logoterapia de fato confronta o paciente com o sentido de sua vida e o reorienta para o mesmo. E torná-lo consciente desse sentido pode contribuir em muito para a sua capacidade de superar a neurose.
O papel do logoterapeuta consiste em ampliar e alargar o campo visual do paciente de modo que todo o espectro de sentido e potencial se torne consciente e visível para ele.
Mesmo uma vítima sem recursos, numa situação sem esperança, enfrentando um destino que não pode mudar, pode erguer-se acima de si mesma, crescer para além de si mesma e, assim, mudar-se a si mesma. Pode transformar a tragédia pessoal em triunfo.
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